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quinta-feira, fevereiro 13, 2020

No ponto onde o silêncio e a solidão


No ponto onde o silêncio e a solidão
Se cruzam com a noite e com o frio,
Esperei como quem espera em vão,
Tão nítido e preciso era o vazio.
Sophia de M. Breyner Andresen, Obra Poética

domingo, janeiro 20, 2019

Do poeta para a poetisa



Poema para a Sofia Andresen (assim o intitulou o autor)

Não sei porque floriram no meu rosto
os olhos e os rostos que há em ti.
Floriram por acaso, ao sol de agosto
sem mesmo haver agosto ou sol em mim.
Não sei porque floriram: se o orvalho as queima
(Ponho as mãos nos olhos para os proteger!)
Tão estranho! florirem no meu rosto
olhos e rostos que não posso ver.

Eugénio de Andrade, Fevereiro de 1946

Na foto: Agustina Bessa-Luís, Sophia de M. B. Andresen e Eugénio de Andrade
Foto e poema surripiados aqui

Eugénio de Andrade nasceu há 96 anos (19 de Janeiro de 1919).



quinta-feira, abril 06, 2017

Nunca mais servirei Senhor que possa morrer

Meditação do Duque de Gandia sobre a morte de Isabel de Portugal


Nunca mais
a tua face será pura limpa e viva,
nem teu andar como onda fugitiva
se poderá nos passos do tempo tecer.
E nunca mais darei ao tempo a minha vida.

Nunca mais servirei senhor que possa morrer.
A luz da tarde mostra-me os destroços
do teu ser. Em breve a podridão
beberá os teus olhos e os teus ossos
tomando a tua mão na sua mão.

Nunca mais amarei quem não possa viver
sempre,
porque eu amei como se fossem eternos
a glória, a luz e o brilho do teu ser,
amei-te em verdade e transparência
e nem sequer me resta a tua ausência,
és um rosto de nojo e negação
e eu fecho os olhos para não te ver.


Nunca mais servirei senhor que possa morrer.


 Sophia de M. B. Andresen

Ontem,veio à conversa com um colega, um verso deste belo, ainda que triste, poema da
Sophia.

sábado, março 25, 2017

Mais tarde será tarde e já é tarde

Homenagem a Ricardo Reis

I

Não creias, Lídia, que nenhum estio
Por nós perdido possa regressar
Oferecendo a flor
Que adiámos colher.

Cada dia te é dado uma só vez
E no redondo círculo da noite
Não existe piedade
Para aquele que hesita.

Mais tarde será tarde e já é tarde.
O tempo apaga tudo menos esse
Longo indelével rasto
Que o não-vivido deixa.

Não creias na demora em que te medes.
Jamais se detém Kronos cujo passo
Vai sempre mais à frente
Do que o teu próprio passo.


Sophia de M. B. Andresen, Poemas sobre Pessoa

domingo, setembro 25, 2016

Há cidades

Há cidades acesas na distância,
Magnéticas e fundas como luas,
Descampados em flor e negras ruas
Cheias de exaltação e ressonância.
Há cidades cujo lume
Destrói a insegurança dos meus passos,
E o anjo do real abre os seus braços
Em nardos que me matam de perfume.
E eu tenho de partir para saber
Quem sou, para saber qual é o nome
Do profundo existir que me consome
Neste país de névoa e de não ser.

Sophia de M. B. Andresen

segunda-feira, abril 25, 2016

Revolução

Como casa limpa
Como chão varrido
Como porta aberta
Como puro início
Como tempo novo
Sem mancha nem vício
Como a voz do mar
Interior de um povo
Como página em branco
Onde o poema emerge
Como arquitectura
Do homem que ergue
Sua habitação

Sophia de Mello Breyner Andresen, O Nome das Coisas
Poema escrito no dia 27 de Abril de 1974

Tinha acabado de completar cinco anos quando aconteceu a Revolução. Não tenho qualquer memória desse dia, não só por ser muito jovem e as minhas preocupações serem, nessa altura, poucas ou nenhumas, mas talvez também por viver longe dos palcos em que tudo teve lugar.
Desse tempo, guardo a lembrança da música "Tourada", que ouvia cantar aos meus primos mais velhos e de outras músicas, hoje indissociáveis da Revolução. Na minha memória moram igualmente os cravos que, em Abril, as professoras nos pediam para desenhar, como as imagens de alguns cartazes ou de murais associados ao antes e ao depois, e palavras como "comício" e "fascista". 
Naquela época, não tínhamos, como a maior parte das famílias, televisão. Dispúnhamos apenas de um pequeno rádio, que, segundo me disse a minha mãe hoje à tarde, enquanto víamos "Capitães de Abril", permitiu aos da casa e a alguns vizinhos, ir acompanhando os acontecimentos desse dia de Abril de há 40 anos.
Lembro-me que, pouco depois, apareceram na vila militares. Tenho uma vaga ideia deles no interior e na entrada do café Primavera.

Texto "resgatado" do baú


domingo, abril 10, 2016

Num deserto sem água

Num deserto sem água
Numa noite sem lua
Num país sem nome
Ou numa terra nua
Por maior que seja o desespero
Nenhuma ausência é mais funda do que a tua.

Sophia de M. B. Andresen

Xuan loc Xuan, "City house"

domingo, agosto 11, 2013

Que nenhuma estrela queime o teu perfil

Que nenhuma estrela queime o teu perfil 
Que nenhum deus se lembre do teu nome 
Que nem o vento passe onde tu passas. 

Para ti criarei um dia puro 
Livre como o vento e repetido 
Como o florir das ondas ordenadas. 

Sophia de M. B. Andresen

quinta-feira, abril 25, 2013

Exílio


Quando a pátria que temos não a temos
Perdida por silêncio e por renúncia
Até a voz do mar se torna exílio
E a luz que nos rodeia é como grades

Sophia de M. Breyner Andresen

quinta-feira, outubro 18, 2012

O teu rosto


É o teu rosto ainda que eu procuro
Através do terror e da distância
Para a reconstrução de um mundo puro.

                                                                  Sophia de Melo Breyner

quarta-feira, setembro 05, 2012

Saudades do mar


(Zambujeira do Mar, Agosto de 2012)

domingo, julho 08, 2012

Saudades do mar


Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho.
Que momentos há em que suponho
Seres um milagre criado só para mim.



Sophia de M. B. Andresen

terça-feira, junho 19, 2012

Não procures verdade

Não procures verdade no que sabes
Nem destino procures nos teus gestos
Tudo quanto acontece é solitário
Fora de saber fora das leis
Dentro de um ritmo cego inumerável
Onde nunca foi dito nenhum nome


Sophia de M. B. Andresen

domingo, maio 27, 2012

sexta-feira, maio 04, 2012

Talvez seja isto...

Espera

Deito-me tarde 
Espero por uma espécie de silêncio 
Que nunca chega cedo 
Espero a atenção a concentração da hora tardia 
Ardente e nua 
É então que os espelhos acendem o seu segundo brilho 
É então que se vê o desenho do vazio 
É então que se vê subitamente 
A nossa própria mão poisada sobre a mesa 
É então que se vê o passar do silêncio 
Navegação antiquíssima e solene 


 Sophia de M. B. Andresen

sexta-feira, janeiro 27, 2012

Espero sempre por ti o dia inteiro



Espero sempre por ti o dia inteiro,
Quando na praia sobe, de cinza e oiro,
O nevoeiro
E há em todas as coisas o agoiro
De uma fantástica vinda.


Sophia de M. B. Andresen

quinta-feira, janeiro 19, 2012

sábado, julho 30, 2011

Mar


(V. F. do Campo, S. Miguel, Julho/2011)

Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só pra mim.


Sophia de M. B. Andresen

sexta-feira, dezembro 17, 2010

A hora da partida

A hora da partida soa quando
Escurecem o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.
A hora da partida soa quando
As árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.

Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.


Sophia de Mello Breyner Andresen

domingo, abril 25, 2010

Nesta hora

Nesta hora limpa da verdade é preciso dizer a verdade toda
Mesmo aquela que é impopular neste dia em que se invoca o povo
Pois é preciso que o povo regresse do seu longo exílio
E lhe seja proposta uma verdade inteira e não meia verdade


Meia verdade é como habitar meio quarto
Ganhar meio salário
Como só ter direito
a metade da vida


O demagogo diz da verdade a metade
E o resto joga com habilidade
Porque pensa que o povo só pensa metade
Porque pensa que o povo não percebe nem sabe


A verdade não é uma especialidade
Para especializados clérigos letrados


Não basta gritar povo é preciso expôr
Partir do olhar da mão e da razão
Partir da limpidez do elementar


Como quem parte do sol do mar do ar
Como quem parte da terra onde os homens estão


Para construir o canto do terrestre
- Sob o ausente olhar silente de atenção -


Para construir a festa do terrestre
Na nudez de alegria que nos veste


Sophia de Mello Breyner, 20 de Maio de 1974

Trinta e seis anos depois, há ainda tanta verdade neste poema...