domingo, dezembro 15, 2024

Caríssima Poesia,

 

                escrevo-te com a certeza de que não me faltarás, de que, no momento oportuno, chegarás com as palavras certas. Como duvidar, se nunca me falhaste?

                Vem da infância este amor intenso. Ensinaste-me, então, as rimas e a reconhecer os ritmos e, com eles, o prazer do jogo, o gosto de destravar a língua, de me enganar e de começar de novo. Apontaste-me as metáforas, as hipérboles e as comparações. Sugeriste-me sentidos ocultos, nas curvas dos versos.

                Seria hoje a mesma pessoa sem ti? Saberia ler o mundo da mesma forma, se não tivesse privado contigo e com os poetas que te estimam? Não creio, Poesia.

                Pela tua mão e pela voz dos poetas (e são tantos!), aprendi a nomear o amor e o desamor, o encontro e o desencontro, a plenitude e o vazio, a felicidade e a dor. Não há nada que não caiba no teu seio. É inesgotável.

                Poesia, percebo que guardas as memórias dos homens, que os instigas, que lhes dás voz. Também por isso te admiro, minha amiga. Também por isso te invejo e almejo imitar-te. Mas faltam-me as palavras e a erudição, falta-me essa intimidade com os poetas – os maiores -, falta-me essa grandeza que te nutre e te eleva.

                Sabes bem que a nossa relação não tem sido pacífica. És o meu céu, mas podes também ser o meu inferno. Se há vezes em que te entranhas, outras há em que te estranho.

                Sabes ser doce e apaziguadora e, por isso, te estimo e te procuro. Porém, podes revelar-te fria e implacável. Nesses momentos, dizes o que não quero ouvir, abres as feridas que teimam em não sarar, obrigas-me a olhar-me ao espelho e eu não gosto do que vejo no espelho. Nesses momentos, odeio-te, sofro a urgência de cortar de vez contigo. Porém, volto sempre, como se volta a um velho amigo que nos magoou. Por hábito? Por amor?

                Escrevo-te na esperança de obter respostas. Eu sei que nunca me faltas!

                Da sempre amiga,

                               L.

Esta "carta" resultou de um repto que me lançaram para participar num projeto que foi ontem, dia 14 de dezembro, consumado e que integrou as celebrações dos 5 anos do selo UNESCO, atribuído aos Caretos de Podence.

Infelizmente, por impedimentos familiares e profissionais, não pude fazer parte da festa, mas sei que esta minha carta foi parar às mãos e - quem sabe? - ao coração de alguém.

quarta-feira, dezembro 04, 2024

As atitudes ficam com quem as tem

 Dirigiu-se a mim com a simpatia habitual. 

«Sabe, já está trabalhar.» - disse, referindo-se ao filho. «Estão muito contentes com o trabalho dele. Até vai ficar efetivo na empresa.», acrescentou, orgulhosa. 

«Fico muito contente, ele merece.», disse-lhe.

«Obrigada. Também tem responsabilidade no sucesso dele. A verdade tem de ser dita.», rematou, antes de se despedir.

Concluídas as minhas compras, dirigi-me à caixa para pagar. À minha frente, seguia, na companhia de uma criança pequena, um jovem que reconheci de imediato. A certa altura, voltou-se para trás e olhou para mim com a indiferença de quem olha para uma desconhecida.

Trabalhou comigo há alguns anos, durante meses. Nesse tempo, era afável e divertido. O tempo não lhe levou apenas o cabelo. Levou-lhe a gentileza e a simpatia. 

Naquele momento, perguntei-me: o que terá este jovem para ensinar ao mais jovem que leva pela mão?

sábado, setembro 28, 2024

Rimas prontas para pessoas tontas

 

Era uma vez um gato espanhol
que passava os dias a tostar ao sol.
Quando tinha fome, comia um rissol
e, se bem calhava, bebia um Sumol.

                      *

Era um pato peripato
que dormia num sapato
e um gato pigmeu
que nada tinha de seu
e um cão mandrião
que não aprendia a lição.

Veio o vento barulhento,
levou tudo pelo ar.
Foi-se o pato, foi-se o gato
e até o meu sapato.
Foi-se o cão mandrião.
Só ficou esta canção.

                  *

Havia um pintor
que pintava com amor.
Usava trincha e pincel
e chamava-se Manuel.

Estas e outras rimas surgiram de improviso, no contacto diário com a minha mãe. As rimas, quanto mais disparatadas ou algo maliciosas, assim como algumas canções infantis ou populares (a "Laurindinha" é uma das preferidas) fazem-na rir ou despertam nela memórias antigas. Inventar rimas ou pequenas narrativas para justificar o lugar onde está ou a ausência de alguém é um desafio constante. Sobra-me pouco tempo para outras "criações". 

terça-feira, setembro 24, 2024

A minha memória anda a trair-me,

por isso, deixei passar o aniversário da ana e da CC... 

Para ambas, Parabéns atrasados e votos de muitos momentos felizes! 

(As ofertas: um poema da Graça Pires, presença assídua nesta "casa", e uma imagem outonal da minha autoria.)

Indago a forma definitiva do outono.
Um diálogo pode mudar a paisagem.
Fazer nascer um poema.
Criar obsessões.
Destruir emboscadas.
Cada instante é a metamorfose
de uma asfixia interior.
Confundo os caracteres e um imaginário
se revela numa iconografia fantástica.
Nas entrelinhas, um espectáculo de ironias
reitera entregas e recusas
como um dever por cumprir.

Graça Pires, Outono: lugar frágil, 1994
 

terça-feira, setembro 17, 2024

Paredes que "falam"



Coimbra, agosto de 2024

 

domingo, agosto 18, 2024

Parabéns!

 Votos de muitos dias felizes, com saúde e boa disposição, Isabel! :)



(Conheci a Isabel na blogosfera, mas que tive o prazer de a conhecer pessoalmente, há alguns anos.)

Para ti, uma imagem de Trás-os-Montes, que captei há dois dias. 

terça-feira, julho 30, 2024

De regresso ao planalto

No domingo, regressei a Mogadouro, a terra que me acolheu desde os 4 anos até à minha saída para a faculdade e onde regressei sempre nas férias, enquanto os meus pais ali moraram.
Desta vez, dei um salto ao Festival Terra Transmontana, que já conta com algumas edições.
Ficam alguns registos fotográficos.










 

quinta-feira, julho 11, 2024

Talvez não fosse

 Aconteceu -me um poema.
Não era longo, nem erudito.
Era apenas a leve pena
de um pássaro no meu ombro,
a luz coada que me chegou
da infância,
o cheiro a feno...
Aconteceu -me um poema.
Ou talvez não fosse um poema.
Apenas um eco, uma brisa,
um grão de areia a morder-me
a memória...
Talvez fosse somente
esse aroma verde de mentrastos,
tinta de amoras nos dedos.
Talvez não fosse um poema...
Para se escrever um poema,
dizem os entendidos,
é preciso ser-se poeta,
é preciso saber escandir os versos,
acertar a métrica, o ritmo e,
com inteligência, a rima.
Para se ser poeta, é preciso que alguém
nos conceda o nome e o estatuto.
É preciso saber usar, com mestria,
figuras de retórica e insinuar sentidos ocultos.
É provável que não me tenha acontecido,
afinal, um poema,
mas vi nascer na página algo que lembra
uma flor a brotar no asfalto.

sexta-feira, maio 03, 2024

Continuo a sentir-me...

 ... quotidiana e tributável, aliás, cada vez mais quotidiana e prosaica, por isso não tenho tido vontade de escrever.

Partilho um devaneio de dezembro de 2018.

Sinto-me quotidiana e tributável,
(Bendito Álvaro, que mandou para o Diabo
as convenções!)
entregue à prosa do fogão, das panelas,
dos seguros, dos impostos e dos papéis.
Só a solidão parece aventurar-se
em voos poéticos mais ousados
– acabei de vê-la a trepar paredes.
 

sexta-feira, setembro 22, 2023

Parabéns, parabéns!

 Parabéns, ana!

Parabéns, CC!


Lagoa do Canário, São Miguel

Votos de muitos dias felizes para ambas.
Abraços.