Há muitos anos viveu na Pérsia um grão-vizir - nome dado naquela época aos chefes dos governos -, que gostava muito de ler. Sempre que tinha de viajar ele levava consigo quatrocentos camelos, carregados de livros, e treinados para andar em ordem alfabética. O primeiro camelo chamava-se Aba, o segundo Baal, e assim por diante, até ao último, que atendia pelo nome de Zuzá. Era uma verdadeira biblioteca sobre patas. Quando lhe apetecia ler um livro o grão-vizir mandava parar a caravana e ia de camelo em camelo, não descansando antes de encontrar o título certo.
Um dia a caravana perdeu-se no deserto. Os quatrocentos camelos caminhavam em fila, uns atrás dos outros, como um carreirinho de formigas. À frente da cáfila, que é como se chama uma fila de camelos, seguiam o grão-vizir e os seus ministros. Subitamente o céu escureceu, e um vento áspero começou a soprar de leste, cada vez mais forte. As dunas moviam-se como se estivessem vivas. O vento, carregado de areia, magoava a pele. O grão-vizir mandou que os camelos se juntassem todos, formando um círculo. Era, porém, demasiado tarde. O uivo do vento abafava as ordens. A areia entrava pela roupa, enfiava-se pelos cabelos, e as pessoas tinham de tapar os olhos para não ficarem cegas. Aquilo durou a tarde inteira. Veio a noite e quando o Sol nasceu o grão-vizir olhou em redor e não foi capaz de descobrir um único dos quatrocentos camelos. Pensou, com horror, que talvez eles tivessem ficado enterrados na areia. Não conseguia imaginar como seria a vida, dali para a frente, sem um só livro para ler. Regressou muito triste ao seu palácio. Quem lhe contaria histórias?
José Eduardo Agualusa, Estranhões e Bizarrocos
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Uma história muito interessante, que uso para a ordem alfabética e não só...os alunos adoram ouvir histórias e esta ensina-nos uma grande lição.
ResponderEliminarOlá, Isabel, esta é, de facto, uma história muito bonita, que nos ensina o valor da leitura.
ResponderEliminarObrigada pelas visitas. Um óptimo ano lectivo. :)