domingo, março 15, 2020

O medo, esse carcereiro

Vou à varanda tirar alguma roupa, que resseca sob o sol intenso, do estendal e oiço - não posso deixar de ouvir - a vizinha do lado, enfermeira, que conversa com alguém ao telefone num tom audível em toda a rua. Dos fragmentos, ficou-me "Entretanto, fiquei com esta tosse. Vamos ver no que isto dá.". Antes disso, ouvi-a comentar que tencionava ir comprar alguns alimentos para ter em casa e, antes ainda, a subir e a descer as escadas do prédio, que não tem elevador.
O medo e a dúvida instalam-se em mim: será seguro ir visitar os meus pais, como costumo? Não temo por mim, mas temo muito por eles, ambos com 80 anos. Temo pelo meu irmão, que trabalha num serviço de saúde. Temos por todas as pessoas vulneráveis, conhecidas e desconhecidas.
Sinto, há dias, uma impressão de estranheza. Fui caminhar com uma amiga, depois de jantar alguns dias. Percebemos que o número de pessoas nas ruas, a caminhar, reduziu drasticamente. Comparo este silêncio aquele que se "ouve" nas noites em que neva. Nessas noites, há algo de mágico, pelo manto branco que tudo cobre, mas há também algo de "trágico", que causa apreensão por sabermos que estamos mais isolados e que, numa situação de emergência, será difícil prestar socorro a quem precise dele. Na situação que vivemos actualmente, há só esta impressão de "trágico"... nada de mágico.
Ontem, no programa "Governo Sombra", Ricardo Araújo Pereira dizia haver no ar "uma impressão de fim do mundo". Não é tanto. Esperemos que não seja.

8 comentários:

  1. Temos todos de ter medo, porque esse medo é que nos faz ter cuidado. Quem não tem medo é irresponsável.
    Também tenho a minha mãe com 93 anos.

    Beijinhos e esperemos que tudo corra bem.
    Bom domingo:))

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Há que ter medo das pessoas que não têm medo e que julgam que nada lhes acontece.
      Isabel, que tudo corra pelo melhor por aí.
      Bom domingo.
      Beijinhos :)

      Eliminar
  2. Eu que sou medricas por natureza, que estou sempre a ouvir dos meus que sou uma exagerada com as minhas recomendações, vejo-os agora mais cuidadosos, mais receosos. Ninguém está imune. O medo também nos faz falta.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Luisa, eu também sou, por natureza, medricas, mas costumo temer mais pela saúde dos que me rodeiam. O meu pai é bastante teimoso e não tem sido fácil convencê-lo de que deve sair de casa o menos possível.
      Que tudo corra bem por esses lados.
      Beijinhos :)

      Eliminar
  3. Querida Deep que venha o medo protector mas não o medo do pânico, que venha o medo que ainda nos faz pensar no outro e não o medo que só nos faz pensar em nós!
    Aquele abraço de sempre
    ~CC~

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Infelizmente, CC, há quem continue a circular por aí sem medo.

      Um abraço

      Eliminar
  4. É bom termos medo para termos mais cuidado. Sem entrar em pânico. Com responsabilidade. Com protecção nossa e daqueles que nos rodeiam.
    Uma boa semana.
    Um beijo.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sobretudo isso, Graça.
      Bom resto de semana.
      Um beijo :)

      Eliminar