terça-feira, fevereiro 26, 2013

Azulândia (em reposição)




Os últimos dias não tinham sido fáceis para o Rei Lívio e para a sua amada esposa, a rainha Olga. Diariamente, chegavam ao palácio notícias de que os encantos do reino começavam a desaparecer a um ritmo alucinante e de forma misteriosa. Primeiro haviam desaparecido as borboletas e as libélulas, logo de seguida, as hortências azuis que adornavam as bermas dos caminhos. Não muito depois, os habitantes da Azulândia deixaram de ver, pela manhã, gotas de orvalho. Temia-se que, em pouco tempo, desaparecessem os regatos de água cristalina, as robustas e centenárias árvores, o canto dos pássaros... A catástrofe total seria no dia em que as nuvens, o Sol, a Lua, as estrelas e o arco-íris deixassem de oferecer luz e cor à ilha.
O Rei Lívio decidiu não se deixar abater pela tristeza, pois sabia que um rei não devia demonstrar fraqueza. Determinou, antes, encontrar uma forma de salvar o seu povo.
Ordenou que ninguém o incomodasse, enquanto se dirigia ao Salão Azul. Depois de ter fechado a pesada porta de madeira, recostou-se na bonita cadeira de braços, estofada de veludo. Puxou para junto de si o repousa-pés. A situação exigia alguma solenidade, conforto e concentração. Nada poderia, por isso, ser esquecido.
Depois de muito cogitar, lembrou-se que os primeiros desaparecimentos tinham ocorrido depois de alguns dos seus súbditos terem visitado os reinos vizinhos e manifestado o desejo de copiar o luxo que viram nesses lugares. Os relatos foram contagiando outros e, aos poucos, quase todos foram ficando com o olhar mortiço, baço.
Lívio compreendeu que esta não seria uma guerra de espadas. Cada um tinha um inimigo dentro de si a destruir. Para isso, seria necessário procurar homens que ainda conservassem a bondade no coração e o brilho no olhar.
Pediu ao chefe do seu exército que percorresse com os seus soldados todos os lugares do reino e que encaminhasse os homens de olhar brilhante para o cume do monte Petra – assim chamado por haver nele uma enorme pedra redonda e lisa.
Os cem habitantes que os soldados conseguiram juntar no cimo do Petra, acenderam uma fogueira, em volta da qual, de mãos dadas, entoaram, até ao nascer do Sol, cânticos de esperança numa língua misteriosa que os seus corações ditava e que até ali desconheciam.
Quando Sol se ergueu, os homens levantaram-se e, em silêncio, começaram a dirigir-se para o palácio. Foi com alegria que puderam constatar que as bermas dos caminhos estavam de novo bordadas de exuberantes hortências azuis, que exibiam nas suas folhas delicadas gotas de orvalho.
Chegados à praça junto ao palácio, foram felicitados pelos restantes habitantesde Azulândia, que estavam felicíssimos por se terem libertado de sentimentos maus como a inveja e a ambição e por terem recuperado o brilho no olhar.
O rei Lívio e a rainha Olga receberam-nos no Salão Azul e mandaram preparar uma grande festa, na qual não faltaram as libélulas e as borboletas para enfeitarem os cabelos das meninas.

deep/ Janeiro de 2009

Desenho: Ana

O texto resultou de um desafio da minha irmã, que antes fez o desenho.

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