domingo, janeiro 08, 2006

"Verba volant"*

AS PALAVRAS São como um cristal, as palavras. Algumas, um punhal, um incêndio. Outras, orvalho apenas. Secretas vêm, cheias de memória. Inseguras navegam: barcos ou beijos, as águas estremecem. Desamparadas, inocentes, leves. Tecidas são de luz e são a noite. E mesmo pálidas verdes paraísos lembram ainda. Quem as escuta? Quem as recolhe, assim, cruéis, desfeitas, nas suas conchas puras? Eugénio de Andrade
Sucumbimos facilmente a um ramalhete de palavras escolhidas, como a um perfume que nos inebria, a um piscar de olho, a um sorriso ambíguo. Por vezes, adivinhamos sentidos ocultos em frases que, aos ouvidos de outros, não significam mais do que aquilo que se disse; outras vezes, as palavras proferidas transportam compromissos.
Um dia, sem aviso, deixam de servir àquele que as proferiu, ficando-lhe desajeitadas como um fato fora de moda. Num momento fizeram-nos sonhar, serviram de alimento ao ego, soaram como música nos nossos ouvidos, no seguinte, resultaram ocas de sentido, absurdas, destrutivas, carregadas de dor e de cepticismo.
(* "As palavras voam.", como diziam os latinos)

4 comentários:

  1. Como eu te entendo....parece que nos dias de hoje as palavras não têem importância alguma...tudo é tão fácil, não há esforço, empenho,vontade....não ha consequências pela leviandade das palavras proferidas nem dos actos praticados...no entanto...algo em nós muda para sempre. temos que aprender a conviver com isso....ou talvez não. beijinhos de boa noite de uma noctívaga para outra :)

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  2. Eu falo por mim... por vezes basta uma expressão para me despertar. Talvez por isso seja um fã de A. Lobo Antunes!

    Saudações

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  3. "Aurora

    A poesia não é voz - é uma inflexão.
    Dizer, diz tudo a prosa. No verso
    nada se acrescenta a nada, somente
    um jeito impalpável dá figura
    ao sonho de cada um, expectativa
    das formas por achar. No verso nasce
    à palavra uma verdade que não acha
    entre os escombros da prosa o seu caminho.
    E aos homens um sentido que não há
    nos gestos nem nas coisas:
    vôo sem pássaro dentro."
    Adolfo Casais Monteiro

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  4. Olá Jaba! Obrigada pela tua visita a este modesto cantinho. Obrigada também pela citação- gostei.

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