domingo, novembro 19, 2017

Não quero

Surripiado do mural de Facebook da autora:
Não quero enganar o tempo,
ser eternamente jovem,
mas envelhecer com calma,
ter raízes e folhas, ser lugar de fazer ninho,
abrigar pássaros, tão frágeis os pássaros,
dar frutos e beijos nas bocas que importam,
perceber como mudam as estações,
fazer as viagens sem pressa,
provar o vento, o mar, a neve, a chuva,
perceber as coisas simples,
as mais difíceis de perceber,
o mistério do amor, da amizade,
dos olhos o brilho e dos sorrisos involuntários.
Não quero ser o primeiro da fila,
um atleta de competição, um funcionário modelo,
não preciso de muitas coisas nem de muitas certezas,
que nas minhas costas, a somar ao lirismo, digam
que não ando em cardume,
que sou uma pessoa decente,
uma pessoa de poucos vícios,
tabaco, livros, discos, gatos, sapatos, amigos,
das que despreza a avareza,
que se comove com a bondade,
com o invisível da beleza,
com a ignorante inocência da adolescência.
E não quero ter vergonha
da minha inexplicável tristeza,
de chorar demasiadas vezes,
de esconder do avesso a dor,
das minhas dúvidas e das minhas dívidas,
de cumprir o que prometo,
do meu perene cansaço,
de me vestir em frente a um espelho,
de perceber o peso das palavras,
de não ter quase nada para dizer,
do tamanho do meu silêncio,
de andar contigo de mãos dadas na rua,
de ter de mim tamanha saudade.

Raquel Serejo Martins

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