domingo, janeiro 10, 2010

quase um balanço

Natais distantes Pergunto-me o que ficou desses Natais distantes que eram vagarosos e tingiam da cor e do sabor de frutos estivais os frios dias de então. De cada um desses Natais que aboliam a noite, instituíam a luz - o que ficou? Pouca coisa: incertos farrapos de memórias que nada resgatam e nada ressuscitam - apenas doem. Talvez uma abelha na janela, perdida do seu tempo, sofrendo a chuva, violentando a vidraça - e o meu irmão a rir-se disso. Talvez a descoberta de um frasco esquecido com doce de ginja no armário do canto, e a boca e os dedos sujos de doce e um caroço engolido sem querer e a vigilância das fezes. Talvez o eco das vozes dos que ceavam lá em baixo desatentos do braço que parti na neve - e eu sem encontrar posição para dormir. Talvez uma gota de champanhe no fundo da taça - a mais doce porque era a do fundo e na garrafa não havia mais e foi a minha Mãe que ma trouxe à cama. Talvez o borralho, as faúlhas, depois apenas cinza. Talvez sal. A.M. Pires Cabral, Têmporas da CInza, 2008 Nota: A. M. Pires Cabral nasceu, em 1941, em Chacim, Macedo de Cavaleiros, residindo actualmente em Vila Real. Ao autor foi atribuído, em Dezembro último, o Prémio de Poesia Luís Miguel Nava 2009.

4 comentários:

  1. Tenho a honra de conhecer pessoalmente este escritor a quem corre, nas palavras e no sangue, um amor tranquilo pelo universo das gentes e das "ambiências" transmontanas... Além disso, é uma pessoa cordial, serena e amiga... e claro: um exímio escritor... o prémio foi muito merecido!

    Beijinho grande!

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  2. Muito belo , sempre os natais perdidos quando nos pomos a recordar!
    Abraço
    _______ JRMARTO

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  3. Belo poema, sem dúvida!
    Afinal, uma excelente compra no meio da confusão de tudo o resto.
    Bom dia, apesar de gelado.

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  4. Virgínia,já tive o prazer de ouvir Pires Cabral em dois momentos diferentes e de testemunhar a serenidade do escritor e da sua paixão pela terra transmontana, que as suas obras revelam também. Penso que sim, que o prémio foi bem merecido.

    Boa semana. Beijinhos :)

    José Marto, os Natais passados, porque já passaram, parecem-nos sempre melhores e mais mágicos!

    Um abraço e votos de boa semana. :)

    Wandolas, foi, das poucas - pouquíssimas -, a melhor compra!

    Boa semana. :) Beijinhos

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