terça-feira, janeiro 29, 2008

As casas,

à força de as habitarmos, ganham alma. Com o tempo, nascem-lhes braços, regaços espaçosos e corações enormes, em que buscamos refúgio, quando o exterior e, por vezes, o nosso interior se revelam hostis.
Quando as deixamos, sentimos que alguma coisa do que fomos ficou com elas e que dos seus compartimentos vazios se desprende uma solidão quase humana. Se caímos na asneira de olhar para trás, na despedida, conseguimos intuir-lhes uns olhos de cão triste e abandonado. Talvez por isso, tenha resistido à tentação de olhar para trás quando disse adeus à casa onde vivi desde os cinco aos dezassete anos e onde voltava todas as férias, até ao Natal passado.
Pelas janelas voltadas a norte dessa casa, chega-nos, de dia, a imagem de uma manta de retalhos em tons de verde e castanho, esporadicamente tingida de branco imaculado; à noite, através delas, o céu exibe-se em todo o seu esplendor estrelado. Por isso, ficar à janela era um passatempo feliz como outro qualquer... como as ininterruptas brincadeiras da infância na rua, onde o trânsito só havia de ser verdade uns anos depois.

2 comentários:

  1. A emoção bateu após ter lido esta postagem. Afinal tb partilhei esse espaço e custa me acreditar que já faz parte do passado...
    Bjinhos

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  2. Odeio despedidas e não sei lidar com as coisas que são para sempre. Belo apontamento! :P Só tu!

    Aquele beijinho

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